segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

A freak year


Após o 11 de setembro, vivemos uma década de falso predomínio geek. O ano que termina nos deixou duas pequenas pérolas que representam bem isso. Entre o menino invisível e o menino tigre, o desejo de potência, de transformar todas as utopias em uma grande bomba de máximo impacto. A frágil aranha, que deixa de se atrapalhar nas suas pernas para vestir um colante e salvar o mundo. Tal poder nunca se concretiza, e o gosto da frustração segue presente. Soa como o pequeno silvo que, baixo, sibila de suas entranhas e que, raras vezes, acaba se tornando em estrondo ensurdecedor. Que as fantasias dominem o monstro, e o pequeno camundongo contenha o senhor das trevas que hoje habita dentro dele.

sábado, 29 de dezembro de 2012

A palavra de deus


Segundo Millor, se uma imagem vale mil palavras, então diga isso com uma imagem. As Aventuras de Pi não fazem por menos. Em uma película com cenas tão lindas, o mais tocante foi reservado às palavras de Pi quando, com uma simples e crua narrativa, encerra a história. Grande, belo e emocionante filme conduzido por Ang Lee, com o dedo de James Cameron. Seu Richard Parker já me foi assustador em 2D, fico imaginando como seria em 3...

domingo, 9 de dezembro de 2012

Welcome to the island of misfits toys



Apesar de, como diz a Veja, As Vantagens de Ser Invisível já nascer um clássico sobre a adolescência, e de me lembrar dos filmes do John Hughes, só que mais seco, comete um pecado já no seu começo - o cara que escreveu o livro, e depois, quem fez o filme, não tem a menor ideia do que é ser invisível. 
Para poder explicar meu ponto de vista, eu agora terei que fazer uma revelação, mas estou tranquilo quanto às suas consequências. Eu tenho o poder de ficar invisível. Desde sempre. Portanto, sei que um jovem invisível não sofre bullying, não faz parte de um grupo tãão maneiro, não abala um refeitório por espancar alguém, e nem beija a garota mais bonita do pedaço. E ela ainda é a Emma Watson! Bem, devo confessar, também, que, mesmo que raro, isto até acontece. Só que ninguém fica sabendo.
Quanto ao meu segredo revelado, tudo bem. Tenho certeza que, assim como minha foto ou minhas postagens, esse texto também ninguém viu...
...
Assisti na mesma tarde a As Vantagens de Ser Invisível e Celeste e Jesse para Sempre. O primeiro trata das dificuldades de ser jovem, e seus jovens amores. O segundo das dificuldades dos casamentos e dos seus divórcios. Entre um e outro, o trailer de Um Evento Feliz que, para mim, trata das dificuldades de ser pai. Qualquer mulher que assistir dirá que é sobre a maternidade, vá lá, não era esse o meu olhar. Durante toda a tarde, minha filha tentando falar comigo por telefone, e eu não consegui respondê-la. Como se pode ver, uma tarde como essa, fácil não foi.
...
Se você já passou por alguma dessas dificuldades, assista aos filmes. Vale a pena.

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

De volta à Ítaca


Que história seria
Se Ulisses voltasse,
Encontrasse apenas
Uma colcha cerzida?

Na noite aquecida
Certamente seria
Bem melhor que a minha.
            ...
Imagem, MarcellaPrata.

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Feitiço de Andie



Funeral Blues

Parem todos os relógios, desliguem o telefone,
Evitem o latido do cachorro com um osso suculento,
Silenciem os pianos e com tambores lentos
Tragam o caixão, deixem que o luto chore.
Deixem que os aviões voem em círculos altos
Riscando no céu a mensagem Ele Está Morto,
Ponham gravatas beges no pescoço dos pombos brancos do chão,
Deixem que os guardas de trânsito usem luvas pretas de algodão.
Ele era meu Norte, meu Sul, meu Leste e Oeste,
Minha semana útil e meu domingo inerte,
Meu meio-dia, minha meia-noite, minha canção, meu papo,
Achei que o amor fosse para sempre: Eu estava errado.
As estrelas não são necessárias: retirem cada uma delas;
Empacotem a lua e façam o sol desmanchar;
Esvaziem o oceano e varram as florestas;
Pois agora nada mais de bom nos resta.

W. H. Auden

Como o filme é de 1994, imagino que já tenhamos 18 anos de quando eu vi esse filme no cinema, exatamente em um dia como o de hoje. Sempre gostei das comédias românticas, desde Cary Grant e Gracie Kelly na Sessão da Tarde. Este filme trazia um outro Grant da qual eu sou fanzaço, com filmes que já vi um monte de vezes. E a Andie... O primeiro que me lembro dela já me foi um filme marcante - Sexo, Mentiras e Videotape. Assisti a vários outros, inclusive um dos meus preferidos entre tantos, O Feitiço do Tempo. Juntando os seus longos cachos com os doces romances vividos no cinema, não há sofá, fim de tarde e lágrima que resista.
Quanto ao poema, sua citação rasga um vazio que as comédias românticas não gostam de lembrar. Nestas, a história termina no momento preciso em que, depois de algumas desventuras, é possível sonhar com a ideia de ser feliz para sempre. Como parece que alguém já disse e Phill, em Punxsutawney, constatou, isso sempre acaba.

Message Fail


Veríssimo certa vez contou a história - diz ele que muito conhecida - de que um sujeito foi convencido a retirar sua placa Vendo Peixe Fresco Aqui, tendo em vista que o local era uma feira, o peixe era visível, se estava na barraca é porque era fresco e, obviamente, era para ser vendido. Retirada a placa, o sujeito continuou vendendo muito bem o seu peixe.
Deixe-me agora vender o meu. Amanhã será meu aniversário. Antecipando os diversos recados que receberei, gostaria de antemão agradecer a lembrança. Obrigado, obrigado. Mas gostaria de agradecer mais ainda aqueles que não me mandarem nenhuma mensagem. Como o peixeiro da história, é fácil verificar que felicitações não são necessárias, afinal de contas, não há o que comemorar. Os desejos usuais da data seriam de pouca eficácia, tendo em vista que, por incrível que pareça, ou eu já tenho o que interessa, ou não mais poderei ter o que realmente importa. O resto é trocado da vida, que às vezes põe, às vezes tira.
Por falar em trocados, poupem seus esforços de correrem ao sedex para me presentearem. Laura já escolheu algo que deve ficar entre os Vingadores e a Liga da Justiça. Qualquer outra coisa ficaria ofuscada por escolha tão certeira. Quanto a possíveis festas, antecipo que eu e ela estaremos recolhidos em local tranquilo, longe dos paparazzi e das grandes aglomerações. Possivelmente entre bichos ou brinquedos de plástico, quiçá na plateia de algum espetáculo.
Se, ao final do dia, verificar que não recebi mensagem alguma, dormirei orgulhoso, acreditando piamente que todos os peixes foram vendidos.
Obrigado.

domingo, 18 de novembro de 2012

1984-2012


Em 1984 estávamos em três no Maracanã para assistirmos ao título brasileiro. Meu pai, naquela época, era mais novo do que sou hoje. É a última lembrança que tenho de estarmos todos juntos. O Natal daquele ano foi o mais triste que já tive. 
Passados 28 anos, vejo os corredores de um shopping suburbano colorido como em festa natalina. Localizado a poucos quilômetros do Engenho de Dentro, os espaços são tomados de verde, branco e grená. Gente de tudo que é idade, nas mais diversas formações - sozinhos, grupos de mesmo sexo, famílias - embelezam o domingo como poucas vezes se viu. A poucos metros dali, minha filha brinca e me aguarda. Não faço parte desse desfile elegante, não levarei minha pequena ao estádio, não ando mais na formação de três. Em breve, me despedirei dela e estarei a mais de 40 quilômetros de distância, de novo junto ao velho, onde celebraremos, sem corridas pelo corredor ou gritos intermináveis, o esperado tetracampeonato.
O Natal desse ano promete.

domingo, 11 de novembro de 2012

Old dog


We are not now that strength which in old days
Moved earth and heaven; that which we are, we are;
One equal temper of heroic hearts,
Made weak by time and fate, but strong in will
To strive, to seek, to find, and not to yield.
"
Alfred Tennyson

...

Houve um tempo em que poderíamos ser zorro, astronauta ou bombeiro. A fantasia era tão poderosa, que não havia ninguém que nos condenasse. É perigoso? Ganha pouco? E a família? Ninguém poderia nos deter. Éramos invencíveis. As primeiras derrotas viriam um pouco mais tarde. Lembro-me, já adolescente, quando fui ver meu primeiro Bond. Éramos três. Uma época em que a fantasia sede lugar para o desejo, e James é o cara que tem todos os brinquedos que queríamos. Os carros, as viagens, as aventuras. As mulheres. O Cara. Mas, como já disse Romário, não é pra qualquer um sentar na janela. E, aos poucos, íamos achando o nosso lugar, distante das paisagens exóticas, dos quartos luxuosos e das máquinas fantásticas.
Hoje o agente, já reencarnado de diversas formas, está fazendo cinquenta anos. Há uma geração que cresceu com suas histórias, músicas e quinquilharias, e que viu a Guerra Fria acabar junto com um monte de outras coisas que perderam valor. Envelhecer não é fácil pra qualquer um, nem para o Bond, James Bond.
Um martíni, por favor.
...
Para ver completo o poema citado por M, aqui.

Carpe Diem Quam Minimum Credula Postero


A realidade
Sempre é maios ou menos
Do que nós queremos.
Só nós somos sempre
Iguais a nós próprios.
Ricardo Reis


Em contradição, como citado no último episódio:


Enquanto puder, vá amar:
Por ter perdido, uma vez, sua melhor parte,
Você para sempre tardará
Robert Herrick
                     ...
E, iguais sempre a eles mesmos, nunca vão. 
Entre o Ricardo e o Roberto, Newsroom.
Para o Robert, ver aqui.

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Remember, remember


"
Lembre-se de novembro. Não vejo porque a traição jamais seja esquecida. Mas e o homem? Lembramos da ideia totalmente, mas não do homem. Pois um homem pode fracassar. Ideias não amam. Não sinto falta das ideias, mas do homem.
"

sábado, 27 de outubro de 2012

Poder de destruição


Via Bitaites.

We're on a road to nowhere



There's a city in my mind 
So come on and take the ride, 
and it's alright, baby it's alright
And it's very far away, 
But it's going day by day 
And it's alright, baby its alright
Would you like to come along? 
You can help me sing this song 
and it's alright, baby it's alright
They can tell you what to do, 
Oh god, they'll make a fool of you,
and it's alright, baby it's alright.

...

Para a discografia do Talking Heads, Volta Ao Mundo Musical.

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Leitura underground



O blogue "Underground New York Public Library" no qual a fotógrafa Ourit Ben-Haim regista os leitores do metro de Nova Iorque foleando os respectivos livros, via Amorita.

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

domingo, 14 de outubro de 2012

Campo dos Sonhos


Um dia, cumprindo obrigação burocrática de preencher ficha com tudo que é número que nos representa, fui alertado pela menina que me atendia que havia uma quantidade considerável de setes presentes naquilo que me identificava. Não achei muito razoável, e nem o sete é meu número preferido. Mas não esqueci. Por mais que para mim não fizesse sentido, parece que, para alguém, fazia.
Os senhores que comandam esse mundo devem entender disso. Depois de tanto tempo, agora acho que  consigo ler seus desígnios, observando com calma como escrevem a minha experiência vivida em números. Pois então, vejamos: nesses últimos 43 anos, houve duas pessoas que foram centrais em minha vida e, com cada uma, convivi quatorze anos. A primeira se foi por determinações do Destino e sua Irmã mais velha, sempre tão implacável. A segunda, pelos caprichos de Desejo e Destruição. Entre as duas, infinitos quatorze anos governados por Delírio e Desespero. Tempo, aliás, que espero que não volte.
Parece que uma nova fase se avizinha, e a última entidade perpétua que me sobra é o Senhor dos Sonhos. Talvez não mais os meus. Acho que nunca falei muito bem sua língua, o que sempre me causou problemas de tradução. Agora, uma outra fala por mim. Tenho uma pequena criatura que comanda meus passos, e me deixa meio refém de sua visão de mundo tão complexa e do baú sem fundo de possibilidades que a contém - afinal, quanto mais jovens somos, mais fundo fica, e ela mal é uma criança. Desde o quarto carnaval de sua existência ela me explica cada vez melhor as coisas, me orienta sobre o que é necessário fazer e me indica que caminhos estamos trilhando. Mas, como deve ser óbvio, não é nada objetivo. Ela se mostra repleta de fantasias, sua linguagem não trata do mundo concreto. Seus olhos estão além, em algum ponto que não iremos chegar, mas que, certamente, nos levará a algum lugar.
Eu também já fui criança. Sonhei sonhos que parecem que foram levados para uma outra realidade, onde eu não seria um, seria dois. Cresci e, quando achei que finalmente seria dois, percebi que mal era um. O Velho da Areia me deixou pouca coisa, mas não tenho do que me queixar. Seus pesadelos também se foram e agora, através de toda a imprevisibilidade de um outro - não mais um duplo, muito menos um complemento, e tão dramaticamente não outro eu -, quem sabe mais quatorze anos para viver.

domingo, 7 de outubro de 2012

Carta aos vencidos



Caros colegas que compartilham a insatisfação com o modelo de gestão atual,

Gostaria de solidarizar-me com a tristeza tomada por tantos com a decisão com esmagadora maioria do processo eleitoral do Rio. Mas, antes de tudo, gostaria de fazer uma reflexão. Tenho lido muitas críticas ao eleitorado que elegeu a atual gestão, e acredito que esse seja um importante ponto para entendimento. A natureza dos votos parece meio óbvia: a enorme quantidade de investimentos ocorridos no Rio durante o último mandato. O lema ‘Somos um Rio’ não deixa engano – governos federal, estadual e municipal estão juntos nisso. A elástica coligação vencedora expõe o modelo que já conhecemos. Não podemos desassociar a candidatura reeleita como isolada. Ela só existe porque existe amplo apoio do governo federal, além do governo estadual. A macropolítica desenvolvida no país se reflete aqui. E estamos falando de um governo federal extremamente popular. Então, nada mais coerente que o eleitor que apoia as políticas da União apoie tudo que vem sendo feito nessa cidade – mais uma vez, feito em larga escala com verba federal que, sabemos muito bem, tradicionalmente escasseia quando os governantes municipais e estaduais são da oposição.
A questão, por conseguinte, que nos cabe refletir, trata-se da coerência dos insatisfeitos. Até onde vai nossa insatisfação? Até onde somos oposição? De resto, esse é o jogo democrático. Não é possível que o eleitor comum seja tão limitado apenas quando discorda de nós.

domingo, 30 de setembro de 2012

In the shadows


"
Só há um tipo de amor que dura. O amor não correspondido.
...

Pense um pouco... somos dois estranhos no meio da noite, e tudo está calmo e silencioso. De repente a neblina cede um pouco e dá pra ver as estrelas. Este momento não parece perfeito? 
Mas passa rápido demais. Até a neblina está voltando. Tudo se movimenta o tempo todo. O movimento é constante. Não é de se estranhar que estou enjoado.
"
Neblina e Sombras, Woody Allen

Ted Beer


A rotina de um exilado na Baixada de Jacarepaguá não é fácil. O Festival do Rio está do outro lado dessa cortina de pedra que isola o farwest do resto da cidade. Com Soderbergh e Wes Anderson tão distantes, só me sobrou um ursinho de pelúcia. O filme é uma curiosa amostra da infantilização de alguém oriundo dos anos 80 que, recheado de cultura nerd que se mistura ao espírito mulherengo, chapado e festeiro de um desbocado urso, tem muita dificuldade para entrar no corpo de um homem de mais de  30 anos. Também curiosa é a escolha do ator protagonista - Marky Mark dançando e cantando mal pode ser encarado como metalinguagem sobre os anos 90, de onde ele é oriundo. Mais curioso ainda é, para um homem de 44 anos que assiste sozinho ao filme, ver o Wahlberg se lamentando porque tudo que ele tem é um amigo de 25 anos e a companhia de, apenas, a Mila Kunis. Como a vida pode ser difícil, rapaz...

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Setembros


Havia um pequeno parque, repleto de brinquedos coloridos, protegido pelas sombras das árvores, onde pousavam pássaros robustos de peito alaranjado, pequenas lavadeiras saltitantes, bentevis animados. Por vezes, aves de longas caudas cortavam o espaço; não menos raro, gaviões circundavam pelo entorno. Com um grande portão de entrada, ele me recebeu várias manhãs. Ao atravessar, eu agradecia a existência de um lugar que procurei por tanto tempo, e que achei que fosse carregar comigo por bem mais.
Olhando através da parede envidraçada do alto do prédio principal, o parque se fazia presente como um mosaico de um colorido disforme. Os ruídos se alteravam, e a calma se ocupava de agitação. Lecionar não é pra qualquer um. A ambição precisa estar em outro lugar; as relações de troca não se dão em moedas correntes. Os desafios são de outra monta, e demandam um tempo que o nosso tempo não nos dá. Mas ali, olhando pelo corredor os tons infantis de azuis e vermelhos que atravessavam o vidro, era possível vislumbrar um lugar que o tempo, e os desejos, corriam de outra maneira.
Longe do continente, é como viver um outro mundo. Como em uma pequena cidade de relações tão próximas, as rotinas de um professor são feitas de horários flutuantes e encontros constantes. Assim estou há onze anos. Foi num Setembro já um tanto distante que tudo começou, com a mudança pra cá e a nova profissão. Começo a me despedir de muita coisa. O parque já não é mais o mesmo. Corroído pelo tempo, seus esqueletos expõem abandono. As copas de suas árvores foram violentadas, e os pequenos traços de sombra sobreviventes são incapazes de conter o sol que nos castiga. Debaixo de tanto calor, recebo a notícia de que, em breve, seus portões se fecharão definitivamente pra mim. Hora de procurar outro lugar. Pra quem, como em música do Tim Maia, não precisa de muita coisa, houve um momento que achei que já tinha demais. Mas são outros tempos. Como tudo que é sólido se desmancha no ar, hora de caminhar. Novos horizontes se apresentam e, ao que tudo parece, os Setembros não se farão mais como antigamente.

domingo, 16 de setembro de 2012

Babel tales


"
História seria algo maravilhoso - tão somente fosse verdadeira
"
Leon Tostoi
...
Tradução de O Globo para epígrafe de Peter Funch encontrável em seu sítio para "The Great Depression and Other Stories". A imagem acima faz parte do trabalho Babel Tales.

Espelhos


"
Temos muitas opiniões sensatas, repetimos muitas palavras de ordem, mas saber quem somos realmente é do departamento das coisas vividas. A maioria de nós optou pela boa conduta, e divulga isso em conversas, discursos, blogs e demais recursos de autopromoção, mas o que somos, de fato, revela-se nas atitudes, principalmente nas inesperadas.
É você. É sempre 100% você. Um você que não constava da cartilha que você decorou. Um você que não estava previsto no seu manual de boas maneiras. Um você que não havia se dado as caras antes. Um você que talvez lhe assombre por ser você mesmo pela primeira vez.
"
Martha Medeiros
...
Trecho adaptado de texto publicado em O Globo de 16.09.12.
...
Ouço tantos que apresentam, e gostam de apresentar, uma outra face que, mesmo que aparentemente não tão digna, é sempre charmosa, vencedora, justificável. Ter um Shrek dentro de si e levá-lo pra passear é relativamente fácil. Eu queria ver alguém exibir pra vizinhança o monstro disforme, o verme desprezível que habita as entranhas, e que vez ou outra precisamos alimentar.

sábado, 15 de setembro de 2012

Sombras



"
Nossas cantoras não ateiam fogo às vestes quando são abandonadas pelos amantes, não se descabelam, não sofrem ao microfone. Elas não querem correr riscos, querem ser cool. Amy Winehouse sabia que onde não há dor não há ganho. Com homens e bandas, aqui e alhures, não é diferente. A impressão é a de que a sociedade ocidental hoje tem imensa dificuldade de se relacionar com as sombras. Entrou numa viagem sem volta de Prozac. Claro, a morte está aí, mas a turma olha pro outro lado e pede pra não beijar na boca.
"
Arthur Dapieve
...
Trecho adaptado de texto publicado em O Globo de 14.09.12, como pode ser lido aqui.

sexta-feira, 7 de setembro de 2012

Cosmópolis



Cosmópolis, de David Cronenberg. Ao entrar no cinema, sala mais cheia que esperava. Ao lado do assento que selecionei quando a sala ainda estava limpa no mapa, um jovem acompanhado da família. Havia outras famílias. Sento. Levanto. Vou para o corredor. Passam por mim um bando de meninas em busca de um vampiro. Espero a hora de começar o filme e procuro um lugar sozinho, longe. As meninas riem, nervosas. Atrás de mim alguém devora um saco barulhento de alguma coisa. Enquanto reflexões sobre o capitalismo dialogam na tela, bocejos sussurram na sala escura. Um levanta, depois outro. Enquanto as vísceras do mundo contemporâneo são expostas,  pessoas desanimam. Menos as meninas, que continuam suspirando a cada pedaço de carne esbranquiçada do protagonista. Ao final, um homem bate palmas de forma intensa, e lamenta - Mas que merda! As famílias que vieram atrás do galãzinho hollywoodiano saem decepcionadas. Não era esse o espetáculo que esperavam. Eu, deslocado da poltrona que me cabia, assisto a tudo, sozinho.

domingo, 2 de setembro de 2012

Laura em um instante


Há uma sabedoria popular que diz que a diferença entre o remédio e o veneno é a quantidade. Comigo não foi bem assim. As pequenas doses diárias de Laura quase me mataram de saudade. Mas foram elas que mantiveram minha sanidade. Dia 6 completam 6 meses que comecei a consumir as Pílulas de Laura. Nesse período, aprendemos a dialogar, dividimos prazeres e rotinas, rimos juntos. A partir de agora, não precisarei mais de um monte de fotos pra preencher qualquer espaço. Aprendi com minha pequena que a alma é feita de câmaras, algumas de vazios perpétuos - ou nunca foram ocupadas ou, quando abandonadas, nunca mais serão. Outras, são como uma Sala Precisa, que se amplia e se mobilia de acordo com a necessidade do coração.
O amor de Laura é preciso. Já viver...

Balão


Foi no fim do verão, quando o céu ficou cinza, queu perdi meu balão. Desde então, como um anjo ou maldição, sua sombra paira sobre minha cabeça.
...
Imagem de Laurent Chehere. Tanto Laurent quanto a Pixar inspiraram-se no filme Balão Vermelho.

sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Vestido de Noiva


Melancholia. Ao entrar para o banho quente, repensei o quanto me perturbei com um filme visto no início de julho e que, afinal de contas, é apenas uma grande síntese da vida. Certamente, diferentemente de alguns outros, o meu incômodo não estava na Grande Verdade revelada, mas sim na presença da criança diante de tais circunstâncias. Espelhamento na Laura, certamente. Talvez algum traço de melancolias de infância, vai saber. Mas, então, percebi. Como uma epifania, entendi o abandono de tudo, a desistência de todos, a espera amarga. Quando tantos veem festa, Justine só enxerga fim. Onde tantos veem arte, ela só enxerga fim. As certezas científicas que tantos veem, ela só vê fim. As convenções não fazem sentido, as cerimônias, reverências e ambições. Tudo é fim. Um a um será abandonado, até o momento que todos começam a enxergar o fim. E aí, então, vem a serenidade. Pelo menos a de Justine. É diante da porta de saída que seu olhar se volta para a única coisa que interessa - a criança, a única personagem que nunca teve condições de entender o que se passava. Infelizmente, não haverá tempo para seu amadurecimento. Enquanto der, aí sim cabe a simulação, o jogo, a encenação.
Entendo bem o que é abandonar o que ninguém teria coragem. Entendo também o que é tentar enquanto tantos pensam em desistir. Curiosamente, como Justine, eu entendo. Que a caverna mágica nos proteja.

segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Point Reyes


                              Barco perdido
                                  jaz encalhado.
                              Maré vazante,
                                  abandono de casco
                              em meio à partida.
                              Não há portos a alcançar
                                  nem beijos de despedida.

                              Vento sentido
                                  em tudo parado.
                              Faca cortante,
                                  tecidos em rasgo.
                              Ilha que espera
                                  que o mar lhe retorne.
                              Horizonte vazio
                                  aponta pro norte.

domingo, 19 de agosto de 2012

Y


Nas voltas que a vida dá, não procure por uma história, ela não estará lá. Como nos quadrinhos dos irmãos Moon&Bá, os personagens se alternam de um quadro ao outro pra apresentar uma ideia, e no filme 360 de Fernando Meirelles o que está em foco é o momento preciso no qual escolhemos um caminho. Profissões, riscos, amores, traições, lembranças e esquecimentos, chegadas e partidas. Depois de feita uma escolha, novas bifurcações surgem e, assim, um labirinto se forma em torno de nós, que nos possui, que nos encerra. Difícil supor que, bastando querer, seja possível recomeçar. Teria o amor esse poder?
...
Para conhecer os irmãos Moon&Bá, uma olhadinha nas tiras de Quase Nada.

A felicidade é azul


Hoje foi um dia muito especial. Começou com três horas intensas de homenagens rendidas pela minha pequena, com direito a palavras carinhosas, muito afeto e, até, canto e dança. Depois disso, o resto do dia se apresentaria sem graça, apenas mais um jogo da existência humana pra cumprir tabela. Até a hora de assistir ao Um Evento Feliz que me fez, em menos de duas horas, reviver os últimos 55 meses. Enquanto a protagonista Barbara atravessa os diferentes planos azulados da película, eu resgatava todos os sentimentos acometidos desde o primeiro movimento em direção à paternidade e tudo que o cerca. Obviamente, para fazer tanto sentido, o papel do pai precisava ser secundário. Mas a sua presença - ou ausência - está espelhada nas desventuras da mãe, com seus encantamentos e desesperos, e o quanto isso atinge o casal. Mesmo nos momentos mais amargos, o filme não abandona seu tom leve de humor, com direito ao final que todos os que passam por suas crises sonham. Como diz Orson Welles, 'se você quer um final feliz, ele depende, claro, de onde você vai terminar sua história'. Nas comédias românticas, todo mundo sabe onde parar.
...
E depois disso, de lambuja ainda assisti ao filme mais badalado da Festival Varilux de Cinema Francês, o Intocáveis, que realmente é uma comédia muito boa. Vale a pena conferir.
...
Nada mais lindo que uma grávida.

domingo, 12 de agosto de 2012

Charlie Best


"
É uma das garotas mais lindas que vi em muito tempo - de chorar de linda. Alguém como ela só deveria existir aos domingos. As pessoas acham que uma garota chega e eu fico: 'Tá, que seja.' Não. Sou como um pirralho de 9 anos sentado com o amigo, dizendo 'Deus do céu!'
"
Charlie Sheen
...

Todos nós já tivemos 9 anos. Foi mais ou menos lá que começamos a testar as possibilidades, a tentar perceber até onde poderíamos. A partir dali começa uma vida na qual uns serão leões, alguns, hienas e um monte de outros, apenas herbívoros, ocultos no mato, escondidos. Enquanto leio a entrevista na Rolling Stones, assisto ao encerramento dos jogos olímpicos, com seus atletas marombados, roqueiros rodados, modelos turbinadas e penso no Parker que assisti na sexta-feira e o desejo dos nerds de todos os cantos do planeta de ganhar uns gramas de músculos e a lourinha do baile, com seus quadrinhos na mão, a cara colada na tela e o poster do Jobs na porta. O grão-geek e toda sua fortuna tem seu altar, mas o sonho encubado continua sendo descrito pelas palavras de George Best: 'Gastei toda minha fortuna com bebidas e mulheres. O resto, eu desperdicei'.

sábado, 11 de agosto de 2012

O mercado invadiu quase tudo


"
Estamos virando uma sociedade de mercado, adotando um estilo de vida no qual invadem quase tudo em nosso cotidiano. Minha preocupação é que isso nunca foi debatido. Escolhemos viver assim? O dinheiro deve valer mais do que outros bens e práticas sociais? Ele deve invadir, como vem invadindo, vida familiar, amizade, sexo, procriação, juventude, educação, natureza, arte, esporte e até como encaramos a morte? 
As famílias, as escolas, são um espaço ótimo. As crianças devem ter aulas de debate, devem ser estimuladas  pelos pais a pensar e discutir questões que afetam o seu dia a dia. O que acontece atualmente, em escolas, ou mesmo em famílias, é adultos substituírem o gosto pelo aprendizado por dinheiro.
"
Michael J. Sandel
...

Não há espaço para o debate e para pensar a vida quando a escola tem apenas duas opções: ou se preocupa com o mercado de trabalho, ou é depósito de jovens. Trecho adaptado da entrevista publicada em O Globo de 11.08.12

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

The idler wheel is wiser than the driver of the screw and whipping cords will serve you more than ropes will ever do

A Playboy de julho já a apresentara como a mulher fruta da estação. A Rolling Stones elogiou seu clipe e suas esquisitices. Hoje, Dapieve já inicia seu texto com um 'Oh, Fiona!'. Para quem gosta de sons incomuns, uma boa pedida. Não à toa, tocou a semana inteira na minha vitrola.

domingo, 5 de agosto de 2012

Cronos

Só eu sei o que vivi quando você, pequena, estava em meu colo. Percebi tudo que tínhamos e que perdemos. Só que agora eu era o pai. Só eu sei o que senti quando vi você rosa, rechonchuda, berrando infinitamente. Todo o resto se foi, o vazio mudou de lugar, e o caminho surgiu. Você tornou-se sentido, e, surpreendido, enxerguei pela primeira vez que espaço ocupar.
O vazio em mim ficou, não há nada a colocar. O que me resta é acompanhar os passinhos, tentando seguir o caminho, até ver onde vai dar.
...
Tudo isso porque vi A Árvore da Vida, meio que um 2001 às avessas, com direito a drama edipiano e um final com gosto de Lost. Num mundo apresentado entre a natureza e a graça, pela primeira vez pensei em máquinas como coisas tão orgânicas, geradas no ventre do animal-cobiça. Mas isso são outros quinhentos.

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Cinefilia



"
Atualmente, a 'cinefilia' soa quase como um vício sexual; talvez tenha sido. Há um mundo secreto, próprio do cinema, que só alguns ainda conhecem. Hoje o cinema é nu. Está exposto nas lojas, feiras e bancas de jornais, está nos hotéis, na ponta dos dedos dos insones, está nas TVs, está rodando bolsinha nas ruas.Tenho saudades da sala escura, do cinema segredo, do cinema dos pobres tímidos e solitários, do cinema como realidade alternativa que analisávamos noite adentro nos bares. Como era bom esperar um filme do Fellini, e o novo Antonioni, e o novo Godard...
...
Talvez seja esta a "essência" do cinema: registrar a morte comendo a vida. Hollywood é um lancinante cemitério de estrelas. São beijos e olhos e corpos embalsamados no tempo da película. Fred Astaire dança no ar do nada, James Dean anunciava a morte em sua melancolia trágica. Sei como dói amar uma morta - eu que me apaixonei por Brigitte Helm em Metrópolis e amei as pernas perfeitas de Louise Brooks e Cid Charisse, na necrofilia da sala escura.
"
Arnaldo Jabor

Texto adaptado de 'Tenho saudades da 'alma' do cinema', publicado no Estadão de 10.07.12. A íntegra pode ser vista aqui.

domingo, 29 de julho de 2012

Gotham Tales


Deixei a sessão de O Cavaleiro das Trevas Ressurge com a emoção de um garoto de seis anos que acabou de ver Zorro no cinema. O respeito à mitologia noturna e ao gosto político do morcego me acertaram em cheio. O homem e seus vazios, o tempo abandonado e suas dores, sua força no compromisso e no sacrifício. O momento de plantar uma semente, recomeçar, refazer. E, depois de tudo, a ideia de que só a morte cala o monstro que habita em seu peito. Ou não.

quarta-feira, 25 de julho de 2012

O Nada



"
‘Nothing comes from nothing/nothing ever could..." (Nada vem do nada/nada poderia vir…)
A frase não é de nenhum físico ou filósofo. É do musical “A noviça rebelde” e seu autor é Richard Rodgers, que no caso, além da música, fez a letra, em vez do seu parceiro Oscar Hammerstein (se pode-se confiar no Google). Rodgers, sem querer, tocou num ponto muito discutido entre as pessoas que se interessam pelo Universo e como ele ficou deste jeito.
Em todas as teorias sobre a criação e a expansão do Universo sempre se chega a um ponto em que ou você aceita que algo se criou do nada ou você abandona qualquer especulação cientifica e vai criar galinhas. Hoje a própria hipótese de tudo ter começado com um Big Bang, que você e eu pensávamos que não era mais hipótese e sim uma verdade indiscutível, está sendo discutida. E o problema é o que fazer com o nada. O que havia antes do Grande Pum era o nada ou antes — só para complicar — não havia nem o nada? Os físicos dizem que o próprio tempo começou com o estouro inaugural que formou o Universo em segundos e portanto não faz sentido falar-se em “antes”. Mas se antes não havia nem antes havia um nada absoluto, do qual, desmentindo o Richard Rodgers, criou-se o Universo. Houve um tempo em que pensar muito sobre tudo isso chamava-se “puxar angústia”.
A descoberta do tal bóson de Higgs foi um feito extraordinário da física. Intuíram a sua existência, concluíram que ele precisava existir mesmo que nunca o tivessem visto, foram atrás e o encontraram. Chegou-se mais perto da chamada teoria unificada do Universo que já era o sonho do Einstein — agora só restam umas duzentas perguntas para serem respondidas. E o nada continuará incomodando.
A mãe do Woody Allen, num dos seus filmes semiautobiograficos, impacienta-se com a preocupação excessiva do menino com o Universo e pergunta: “O que você tem a ver com o Universo?” Muita gente prefere fazer como aquele inglês que passa por um campo de batalha sem se abaixar ou tomar qualquer outra precaução com as balas que voam ao seu redor, pois é um estrangeiro e a guerra não lhe diz respeito. Não temos como nos precaver contra o que o Universo nos reserva, mas ele decididamente diz respeito a todos. Até criadores de galinhas...
"
Luis Fernando Veríssimo

...
O texto foi publicado em O Globo de 22.07.12. A imagem é de Alberto Montt, via Toca do Calango.

Ficção twitada


Fã das redes sociais, a escritora americana Jennifer Egan tinha cismado: tem de haver um jeito de contar ficção seriada pelo Twitter.
A ganhadora do Pulitzer queria usar a ferramenta para criar uma literatura a ser lida, ansiada e seguida, como os folhetins do passado.
Mas havia sério empecilho: a ficção de Jennifer é escrita à mão! Como, então, calcular textos, adequar cada tweet a até 140 caracteres?
Depois de muita procura, a resposta veio na forma de um caderno japonês, com 8 retângulos por página, contou Jennifer em palestra na Flip.
Lá foi ela, então, escrevendo livremente. Nascia 'Black Box', conto publicado há dois meses pelo Twitter da revista americana 'New Yorker'.
Um trecho era publicado por minuto, durante uma hora, ao longo de dez dias. Depois, virou e-book. Pois, quem gostou da ideia, que se anime.
Em fase de tradução e ainda sem nome em português, 'Black Box' será publicado no Twitter da Editora Intrínseca, no mesmo modelo, em agosto.
'Tinha de ter uma história que não pudesse ser contada de outra forma', disse Jennifer na Flip. 'E tinha de ter uma forma de contar.'
...
Texto publicado na coluna Click! em O Globo de 22.07.12

segunda-feira, 23 de julho de 2012

Ticket, please


Quando até os trens estão perdidos, refazer o caminho de volta fica muito difícil. Para não escapar o último vagão que partiu, talvez seja preciso abandonar algumas malas pelo caminho, e buscar um novo itinerário. Mesmo porque, de qualquer forma, o trem nunca retorna para o mesmo lugar.

domingo, 22 de julho de 2012

Meia-Noite em Nova Iorque


Alice é uma mulher em busca de si mesma. Precisa aprender a olhar ao redor para reconhecer o que a cerca; precisa entender o que é o amor. Entre um marido de 15 anos e o amante encantador, talvez não fique nada, a não ser uma doce lembrança do gosto pelo jazz.
...
Se o texto é referente a Simplesmente Alice, o título é uma lembrança a Meia-Noite em Paris. Na balança do destino, tanto Gil quanto Alice pendem por dois caminhos até se encontrarem em um terceiro. No final, o amor - de que jeito for - é o que prevalece.

quarta-feira, 18 de julho de 2012

Velozes e Furiosos


A música faz parte da trilha de O Sucesso a Qualquer Preço, filme com um elenco de primeira para um roteiro de David Mamet. Diálogos velozes, posturas furiosas, e uma intensa corrida para sobreviver em um mercado voraz.

terça-feira, 17 de julho de 2012

Annie Hall do começo ao fim


Os amores parecem impossíveis e enlouquecedores, mas são a cereja do bolo, mesmo para quem acha que a vida se divide entre horrível e miserável.

sábado, 14 de julho de 2012

O fantasma do Sonny



'
O que acontece quando se juntam 16 mil processadores, fazendo um bilhão de conexões, numa das maiores redes neurais já desenvolvidas, e se dá a esse “cérebro eletrônico” a possibilidade de fazer o que quiser? Ele sonha com a conquista do mundo? Com a idéia de Deus? Com Gisele Bundchen? Que nada: como eu, você e todo mundo, ele começa a procurar vídeos de gatos na internet.
 Essa curiosa experiência foi divulgada na semana passada pelo Google, que criou a rede no seu secretíssimo laboratório X. O “cérebro” foi alimentado por dez milhões de imagens randômicas, totalizando algo em torno de 20 mil objetos, sem qualquer espécie de instrução ou catalogação. O objetivo é que possa vir a identificar padrões que não tenham necessariamente tags, para agilizar sistemas de busca. Por exemplo, ele poderá identificar rostos sem que eles tenham sido rotulados.
 “Durante o treinamento, nós nunca dissemos: ‘isso é um gato’” — disse Jeff Dean, da equipe do Google, ao “New York Times” – “A rede inventou sozinha o conceito de gato”.
 Como seria de se imaginar, a notícia causou alvoroço na rede, onde a presença dos gatos é lendária. Seu efeito colateral foi aumentar ainda mais a presença dos bichanos online, já que a maioria dos blogueiros e jornalistas de tecnologia que repercutiu a notícia aproveitou para ilustra-la com fotos de seus próprios bichinhos de estimação.
'
Cora Ronai
...
Cada cérebro sonha com o gato que lhe convém. Se uns sonham com o Will Smith, outros sonham com a Julie Newmar. Obviamente, referências ao Eu, Robô e ao Batman. Trecho to texto da Cora publicado aqui.

domingo, 8 de julho de 2012

Vergonha e abandono


Entre a melancolia invencível e a vergonha profunda, graceja uma suicida em potencial. Dois filmes difíceis de assistir mas que, juntos, talvez signifiquem alguma coisa. Confrontado com a inevitabilidade do fim, o que fazer? Vivemos tempos de luxúria e descarte, de facilidades e processos acelerados. Abandonamos o poder do compromisso, da responsabilidade, pois precisamos ser felizes, não? Afinal, tudo não acaba? Como se a garantia do gozo momentâneo pudesse sustentar uma vida até seu fim. Algo precisa ser criado, cultivado e mantido, e não será sem sacrifício. Essa máquina processadora altamente veloz que trabalha em nossas cabeças precisa dar algum sentido a tudo, e dessa forma criar sistemas de proteção, conforto e estímulo. Pra fazermos diferente, precisaríamos criar um software mais poderoso que a família. Até lá, é o melhor que há. Como remontá-la, em dias tão difíceis, virou a pedra de Roseta do mundo atual. E aí, vai encarar?
...
Os filmes citados são, obviamente, Melancholia e Shame. O enorme desejo de potência de New York, New York é parte do último.

Melancolia invencível


Já bastava a minha. Eu não precisava de mais essa. Nem como pretexto pra ver a Kirsten nua.

segunda-feira, 2 de julho de 2012

Blind date


Quantos desencontros cabem em uma vida? Amores que se desfazem, amores impossíveis, amores enrustidos, amores simplesmente perdidos. Tanto se espera enquanto se procura, e o pouco que se acha não dá pra quase nada. Apagam-se as luzes e só fica o silêncio. Hoje não haverá boa noite.

domingo, 1 de julho de 2012

Melancolia de Ozymandias




"
Ozymandias
Encontrei um viajante de uma terra antiga,
Que disse: Duas pernas feitas de pedra, vastas e sem tronco,
Permanecem no deserto. Perto delas, na areia,
Meio enterrada, uma paisagem devastada se estende.
(...)
E no pedestal estão estas palavras:
“Meu nome é Ozymandias, Rei dos Reis;
Vejam minhas obras, poderosos, e desesperem!”
[Entretanto] Nada resta. Em volta, só a decadência
Dessa colossal destruição, crua e sem limites
Apenas solitária areia por toda parte.
"
Percy Shelley
...

Nunca pensei que um dia combinaria Woody Allen com o dr. Jack Shepard.

Todos os caminhos levam a Roma


Diante de todo um império em ruína, nem o amor em pé fica. Se desfaz, se enrosca, e se transforma em outra coisa. Diante da vida que finda, vivê-la, e relembrá-la, é o melhor que há. Das Memórias do que passou, e a dor de um amor que se foi, lembrá-lo com leveza talvez só Roma o permita. E a idade, que reconhece que muito do que já foi vivido, jamais retornará.
...
Parece dramático mais não é. É Woody Allen.

O sentido da vida

"
Foi um desses ótimos dias de primavera. Era domingo e era possível sentir que o verão estava chegando. Eu lembro que naquela manhã eu e Dorrie tínhamos caminhado no parque. Voltamos ao apartamento. Ficamos só lá sentados. Eu coloquei um disco de Louis Armstrong, uma música que eu cresci amando. Foi muito bonito. Eu olhei ao redor e vi Dorrie lá sentada. E lembro que pensei no quanto ela era maravilhosa, e no quanto eu a amava. E acho que foi a combinação de tudo. O som da música e a brisa, e como Dorrie estava linda. E por um breve momento, tudo pareceu se encaixar perfeitamente. E eu me senti feliz, de uma forma quase indestrutível. É engraçado. Aquele simples momento de contato, me tocou de uma forma muito profunda.
" 
Woody Allen
...
Se durante uma estreita passagem entre a primavera e o verão Woody Allen encontrou o sentido da vida, para alguns o inverno parece que não tem fim.
...
Fala de Woody Allen na boca de Sandy, de Memórias.

quarta-feira, 27 de junho de 2012

Síndrome de Laio


"
Em um ensaio intitulado 'O pai antes do Édipo', Maria Rita Kehl lembra que os 'psicanalistas afiliados aos ensinamentos de Freud e Lacan estão acostumados a pensar que o pai, no chamado primeiro tempo do Édipo, não existe para a criança'. Para a psicanálise dessa tradição, a paternidade, ao menos da perspectiva do filho, só começa no momento em que o pai se torna aquele que interrompe a experiência fusional do infans com a mãe. É por essa presença limitadora - chamada de função paterna, uma vez que não necessariamente requer um pai biológico - que se 'resolve' o complexo de Édipo e a criança assimila a Lei, e com ela a falta e o desejo (as aspas em 'resolve' o complexo de Édipo é, claro, mal-resolvido). Mas então, pergunta-se Rita Kehl, 'se para o recém-nascido só existe a mãe, indiferenciada do infans, extensão de seu corpo de prazer, que diferença pode fazer a intervenção precoce do Outro como o intruso, o terceiro indesejável, o dono do falo, cruel privador da mãe e do bebê?' Em outras palavras, o que é o pai antes do Édipo?
"
Francisco Bosco
Trecho do texto publicado em O Globo de 27.06.12

...

Hoje desconfio que a paternidade se define na busca por essa resposta, tal qual o cavaleiro arthuriano que nunca a encontra.

sexta-feira, 22 de junho de 2012

Fichas brancas

- Se você é tão bom em ler as pessoas...
- Por que eu perco?
- Sim.
- Porque é impossível ganhar sempre.
- Você pode vencer os jogadores, mas não a sorte. Às vezes, você está fora do ritmo. Lê a pessoa acertadamente, mas faz a coisa errada.
- Por que confiou nela?
- Por que não se pode confiar nem em si mesma.
...
As fichas estão na mesa, e o jogo é pulsante. As cartas são dadas e, sobre elas, nada pode ser feito. Os riscos são grandes, e neles está o gosto pela vida. Muito se ganha ou se perde, mas o que se busca é a aposta. Assim são as mulheres, pra quem o mundo é uma grande toalha verde. Não os homens, que aguardam após cada rodada na boca do caixa, acreditando no seu cacife como moeda de troca. Pelo menos é assim em My Blueberry Nights. Onde a história corre solta, a música é boa, e a Natalie está linda como nunca.

quarta-feira, 20 de junho de 2012

Sinnerman


Como alguém pode ser tão pretensioso? Todas as mulheres - e que mulheres! -, o sucesso profissional, a condição financeira... Torna justificável o vício em prostitutas e pílulas, o sequestro do filho, a amizade hipocondríaca. Todas as traições possíveis, inclusive as divinas. Como pode alguém cometer tantos pecados e sentir-se tão orgulhoso? Que a vida é assim, todo mundo sabe. Mas quando o sujeito, com aquela cara de idiota, faz algo desse tipo, nós chamamos de arte.
...
Logicamente, referência a Desconstruindo Harry.